Livro: A Caminho do Super Homem Página 2
Autor - Fonte: Rosaura Paranhos
...estres que atravessam ruas
e avenidas, em horários de maior movimento, desligados dos
riscos que estão correndo naquele instante.
Com a insatisfação de quem tem um problema fundamental na vida e ainda não obteve nenhuma resposta, entrei para o curso de Psicologia porque me parecia o que mais se aproximava da questão mente–corpo.
Além disso, lera aos 15 anos alguma coisa de Freud que muito me impressionara e que já me fizera, na época, inclinada para a Psicanálise.
Na verdade, fui cursar Psicologia somente muito mais tarde, com
quase 28 anos. Lá pude constatar que o assunto que tanto me
interessava e que fazia parte do currículo fora rejeitado pela
maioria dos psicólogos, como uma inútil questão filosófica,
e isso me fez sentir desanimada. Porém, minha vida já estava
comprometida com a Psicologia, e, assim, o problema mente–
corpo aparentemente desapareceu por um bom tempo.
Com a exceção de uma certa curiosidade diante o mundo
moderno e suas contradições, minha atenção se encontrava
inteiramente absorvida pela formação analítica que pretendia
seguir ao término do curso e após três anos e meio de
análise. Foi então que alguns fatos inesperados aconteceram,
mudando para sempre o curso de minha vida. Havia alugado
um consultório e fizera um convênio com uma instituição.
Esperava portanto o aparecimento de clientes para, assim,
dar início à vida profissional. Nesse meio tempo, uma
antiga inspiração poética r...
tornou, juntamente com a alegria
da gravidez inesperada de um filho temporão.
Ainda que estivesse atendendo a uma recomendação
médica de repouso, devido à gravidez tardia, a decisão de
suspender as atividades profissionais que mal se iniciavam e
me dedicar à produção de um livro de poesias parecia uma
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Rosaura Paranhos
temeridade. Depois de quase oito meses de trabalho e pouco
ou nenhum progresso da poesia, em meados de 89, resolvi
descansar do trabalho improdutivo, proporcionando-me um
prazer que desde criança ansiava: ler o tão famoso romance
de Cervantes, o Dom Quixote de la Mancha.
A revolução que a leitura do livro provocou em minha
vida me emociona profundamente até hoje, passados quase
dez anos. Finalmente encontrava uma resposta para a velha
indagação sobre a mente e o corpo do homem, que tanto me
intrigava. Contudo, ela veio a mim como uma profunda inspiração.
Uma persuasão íntima e não uma solução racional, sus -
citando uma série de questões e como conseqüência, obrigandome,
desde então, a um árduo trabalho para respondê-las. O livro
representa uma tentativa de resposta para todas elas.
Quem já leu o romance e se deliciou com as aventuras
do cavaleiro, sente que está diante de uma loucura sui generis.
Dom Quixote não padece de uma loucura comum, dessas normalmente
familiares aos psiquiatras. A par das extravagâncias
cometidas em nome de um ideal de proteção aos mais fracos,
o fidalgo apresenta uma profunda e admirável sabedoria. Além
disso, nada do que existe nele nos é estranho. Ao contrário.
Sua loucura fornece-nos um espelho onde podemos desafogar,
em lágrimas, as desditas pela triste, laboriosa e frágil condição
humana e, ao mesmo tempo, desopilar, em risos, o peso
dessa constatação, perante a observação do quanto há de ridículo
na caricatura traçada. Mais do que apenas emoções, o
romance tem o poder de suscitar a impressão de uma verdadeira
revelação, em muitas pessoas. Também a mim, a leitura
despertou um forte pressentimento. Fui tomada do sentimento
de que nas temerárias aventuras do cavalheiro se elucidava
o maior conflito do homem. O que no romance sobressaía
como o choque entre a imaginação desenfreada do fidalgo e a
frágil constituição física submetida aos mais arriscados empreendimentos,
poderia ser facilmente transposto para as contradições
suscitadas pela interação entre a mente e o corpo do
homem que vivencia um formidável e atraente mundo tecnológico,
cheio dos mais inusitados perigos e imprevistos.
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A caminho do super-homem
Não gostaria, em hipótese alguma, que a palavra “revelação”
fosse responsável por um equívoco, que consistiria
em presumir neste livro alguma coisa mais do que o fruto de
uma intuição. Apesar de não ter, pessoalmente, nada contra
histórias misteriosas, o fato do meu trabalho ser confundido
com algo religioso ou como mais um produto da Nova Era
não correspo...
ofunda e admirável sabedoria. Além
disso, nada do que existe nele nos é estranho. Ao contrário.
Sua loucura fornece-nos um espelho onde podemos desafogar,
em lágrimas, as desditas pela triste, laboriosa e frágil condição
humana e, ao mesmo tempo, desopilar, em risos, o peso
dessa constatação, perante a observação do quanto há de ridículo
na caricatura traçada. Mais do que apenas emoções, o
romance tem o poder de suscitar a impressão de uma verdadeira
revelação, em muitas pessoas. Também a mim, a leitura
despertou um forte pressentimento. Fui tomada do sentimento
de que nas temerárias aventuras do cavalheiro se elucidava
o maior conflito do homem. O que no romance sobressaía
como o choque entre a imaginação desenfreada do fidalgo e a
frágil constituição física submetida aos mais arriscados empreendimentos,
poderia ser facilmente transposto para as contradições
suscitadas pela interação entre a mente e o corpo do
homem que vivencia um formidável e atraente mundo tecnológico,
cheio dos mais inusitados perigos e imprevistos.
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A caminho do super-homem
Não gostaria, em hipótese alguma, que a palavra “revelação”
fosse responsável por um equívoco, que consistiria
em presumir neste livro alguma coisa mais do que o fruto de
uma intuição. Apesar de não ter, pessoalmente, nada contra
histórias misteriosas, o fato do meu trabalho ser confundido
com algo religioso ou como mais um produto da Nova Era
não corresponderia à realidade. As idéias que nasceram da
leitura de Dom Quixote não foram gratuitas, porque já existia
em mim uma indagação à procura de uma resposta. O
romance representou o estímulo apropriado a essa resposta.
Quanto à intuição, não podemos nos esquecer que ela representa
uma forma natural e legítima do processo de conhecimento,
principalmente na mulher.
Desdobrada em várias idéias, a síntese do pensamento
que deu origem a este livro poderia ser explicada como a
constatação de que o homem se identifica muito mais com a
mente do que com o frustrador corpo, constituído de carne
frágil e mortal. A visão que tive dessa realidade nasceu da
própria interpretação das figuras do par Quixote–Sancho. O
reconhecimento das duas figuras como símbolos convergentes
para o maior conflito do homem foi apenas o começo de
uma verdadeira transformação na minha forma de encarar a
vida e o mundo em que vivemos.
Ao final da leitura de Dom Quixote, eis que uma segunda
figura emergiu, em meu pensamento, como complemento
da dupla Quixote–Sancho. Acredito que o seu aparecimento
se deveu ao fato de que a tríade representativa das circunstâncias
existenciais que regem a condição humana, isto é, o homem,
resultado da interação entre a mente e o corpo, exigia
um terceiro elemento para a sua melhor compreensão. Um
símbolo não menos comovente e muito significativo para o
mundo moderno — o imortal Carlitos, de Charles Chaplin.
No mo...
nderia à realidade. As idéias que nasceram da
leitura de Dom Quixote não foram gratuitas, porque já existia
em mim uma indagação à procura de uma resposta. O
romance representou o estímulo apropriado a essa resposta.
Quanto à intuição, não podemos nos esquecer que ela representa
uma forma natural e legítima do processo de conhecimento,
principalmente na mulher.
Desdobrada em várias idéias, a síntese do pensamento
que deu origem a este livro poderia ser explicada como a
constatação de que o homem se identifica muito mais com a
mente do que com o frustrador corpo, constituído de carne
frágil e mortal. A visão que tive dessa realidade nasceu da
própria interpretação das figuras do par Quixote–Sancho. O
reconhecimento das duas figuras como símbolos convergentes
para o maior conflito do homem foi apenas o começo de
uma verdadeira transformação na minha forma de encarar a
vida e o mundo em que vivemos.
Ao final da leitura de Dom Quixote, eis que uma segunda
figura emergiu, em meu pensamento, como complemento
da dupla Quixote–Sancho. Acredito que o seu aparecimento
se deveu ao fato de que a tríade representativa das circunstâncias
existenciais que regem a condição humana, isto é, o homem,
resultado da interação entre a mente e o corpo, exigia
um terceiro elemento para a sua melhor compreensão. Um
símbolo não menos comovente e muito significativo para o
mundo moderno — o imortal Carlitos, de Charles Chaplin.
No mo...