Livro: A Alma do Homem sob o Socialismo
Autor - Fonte: OSCAR WILDE
...Título Original: The social soul of man under the socialism
Tradução: Mia Wallace & Vincent Vega
Data da Digitalização: 2004
Data Publicação Original: 1891
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A ALMA DO HOMEM
A vantagem principal da consolidação do Socialismo está, sem dúvida, no fato de que ele
poderia nos livrar dessa imposição sórdida de viver para outrem, que nas condições atuais pesa
de forma implacável sobre quase todos. Com efeito, dificilmente alguém consegue escapar.
De quando em vez, no decorrer do século, um grande cientista como Darwin; um grande
poeta como Keats; um aguçado espírito crítico como M. Renan; um artista supremo como
Flaubert pode isolar-se, manter-se ao largo do clamor das exigências alheias, por-se "ao abrigo
do muro", no dizer de Platão, e assim elevar à perfeição o que está nele, para o bem
inestimável de si mesmo, e para o bem inestimável e definitivo da humanidade. Estes, porém,
são exceções.
A maioria dos homens arruína suas vidas por força de um altruísmo doentio e extremado
- são forçados, deveras, a arruiná-las. Acham-se cercados dos horrores da pobreza, dos
horrores da fealdade, dos horrores da fome. É inevitável que se sintam fortemente tocados por
tudo isso. As emoções do homem são despertadas mais rapidamente que sua inteligência; e,
como ressaltei há algum tempo em um ensaio sobre a função da crítica, é bem mais fácil
sensibilizar-se com a dor do que com a idéia. Conseqüentemente, com intençõ...
s louváveis
embora mal aplicadas, atiram-se, graves e compassivos, à tarefa de remediar os males que
vêem. Mas seus remédios não curam a doença: só fazem prolongá-la. De fato, seus remédios
são parte da doença.
Buscam solucionar o problema da pobreza, por exemplo, mantendo vivo o pobre; ou,
segundo uma teoria mais avançada, entretendo o pobre.
Mas isto não é uma solução: é um agravamento da dificuldade. A meta adequada é
esforçar-se por reconstruir a sociedade em bases tais que nela seja impossível à pobreza. E as
virtudes altruístas têm na realidade impedido de alcançar essa meta. Os piores senhores eram
os que se mostravam mais bondosos para com seus escravos, pois assim impediam que o
horror do sistema fosse percebido pelos que o sofriam, e compreendido pelos que o
contemplavam. Da mesma forma, nas atuais circunstâncias na Inglaterra, os que mais dano
causam são os que mais procuram fazer o bem. Por fim presenciamos o espetáculo de homens
que estudaram realmente o problema e conhecem a vida - homens cultos do East End - virem a
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público implorar à comunidade que refreie seus impulsos altruístas de caridade, benevolência e
coisas desta sorte. Fazem-no com base em que essa caridade degrada e desmoraliza. No que
estão perfeitamente certos. A caridade cria uma legião de pecados.
E há mais: é imoral o uso da propriedade privada com o fim de mitigar os males
horríveis decorrentes da instituição da propriedade privada. É tão imoral quanto injusto.
Com o Socialismo, tudo isso naturalmente será mudado. Não haverá pessoas enfiadas
em antros e em trapos imundos, criando filhos doentes e oprimidos pela fome, em ambientes
insuportáveis e repulsivos ao extremo. A segurança da sociedade não dependerá, como hoje,
das condições climáticas. Se cair uma geada, não teremos uma centena de milhares de homens
desempregados, vagando pelas ruas em estado repugnante de miséria, implorando esmolas ao
próximo, ou apinhando-se às portas de albergues abomináveis para garantir um pedaço de pão
e a pousada suja por uma noite. Cada cidadão irá compartilhar da prosperidade e felicidade
geral da sociedade; e, se vier uma geada, ninguém será prejudicado.
Por outro lado, o Socialismo em si terá significado simplesmente porque conduzirá ao
Individualismo.
Socialismo, Comunismo, ou que nome se lhe dê, ao transformar a propriedade privada
em bem público, e ao substituir a competição pela cooperação, há de restituir à sociedade sua
condição própria de organismo inteiramente sadio, e há de assegurar o bem-estar material de
cada um de seus membros. Devolverá, de fato, à Vida, sua base e seu meio naturais.
Mas, para que a Vida se desenvolva plenamente no seu mais alto grau de perfeição, algo
mais se faz necessário. O que se faz necessário é o Individualismo. Se o Socialismo for
Autoritário; se houver governos armados de poderes econômicos como estão agora armados...
É tão imoral quanto injusto.
Com o Socialismo, tudo isso naturalmente será mudado. Não haverá pessoas enfiadas
em antros e em trapos imundos, criando filhos doentes e oprimidos pela fome, em ambientes
insuportáveis e repulsivos ao extremo. A segurança da sociedade não dependerá, como hoje,
das condições climáticas. Se cair uma geada, não teremos uma centena de milhares de homens
desempregados, vagando pelas ruas em estado repugnante de miséria, implorando esmolas ao
próximo, ou apinhando-se às portas de albergues abomináveis para garantir um pedaço de pão
e a pousada suja por uma noite. Cada cidadão irá compartilhar da prosperidade e felicidade
geral da sociedade; e, se vier uma geada, ninguém será prejudicado.
Por outro lado, o Socialismo em si terá significado simplesmente porque conduzirá ao
Individualismo.
Socialismo, Comunismo, ou que nome se lhe dê, ao transformar a propriedade privada
em bem público, e ao substituir a competição pela cooperação, há de restituir à sociedade sua
condição própria de organismo inteiramente sadio, e há de assegurar o bem-estar material de
cada um de seus membros. Devolverá, de fato, à Vida, sua base e seu meio naturais.
Mas, para que a Vida se desenvolva plenamente no seu mais alto grau de perfeição, algo
mais se faz necessário. O que se faz necessário é o Individualismo. Se o Socialismo for
Autoritário; se houver governos armados de poderes econômicos como estão agora armados
de poderes políticos; se, numa palavra, houver Tiranias Industriais, então o derradeiro estado
do homem será ainda pior que o primeiro.
Atualmente, em virtude da existência da propriedade privada, muitos têm condições de
desenvolver um certo grau bastante limitado de Individualismo. Ou estão desobrigados da
necessidade de trabalhar para sustento próprio, ou em condições de escolher a esfera de
atividade que seja realmente compatível com sua índole e lhes dê satisfação. Estes são os
poetas, os filósofos, os homens da ciência, os homens da cultura - numa palavra, os verdadeiros
homens, os que fizeram verdadeira sua individualidade, e nos quais todo o Humano alcança
uma parcela dessa verdade. Por outro lado, há muitos que, por não possuírem qualquer
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propriedade privada, e por estarem sempre à beira da inanição completa, são compelidos a
fazer o trabalho de bestas de carga, a fazer um trabalho totalmente incompatível com sua
índole, ao qual são forçados pelo compulsório, absurdo e degradante jugo da privação. Estes
são os pobres, e entre eles não há elegância nas maneiras nem encanto no discurso, civilização,
cultura, refinamento nos prazeres, ou alegria de viver. Da força coletiva deles, a Humanidade
ganha muito em prosperidade material. Mas o que ela ganha é apenas o produto material, e o
homem pobre não tem em si mesmo nenhuma importância. É apenas o átomo infinitesimal de
uma força que, longe de tê-lo e...
de poderes políticos; se, numa palavra, houver Tiranias Industriais, então o derradeiro estado
do homem será ainda pior que o primeiro.
Atualmente, em virtude da existência da propriedade privada, muitos têm condições de
desenvolver um certo grau bastante limitado de Individualismo. Ou estão desobrigados da
necessidade de trabalhar para sustento próprio, ou em condições de escolher a esfera de
atividade que seja realmente compatível com sua índole e lhes dê satisfação. Estes são os
poetas, os filósofos, os homens da ciência, os homens da cultura - numa palavra, os verdadeiros
homens, os que fizeram verdadeira sua individualidade, e nos quais todo o Humano alcança
uma parcela dessa verdade. Por outro lado, há muitos que, por não possuírem qualquer
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propriedade privada, e por estarem sempre à beira da inanição completa, são compelidos a
fazer o trabalho de bestas de carga, a fazer um trabalho totalmente incompatível com sua
índole, ao qual são forçados pelo compulsório, absurdo e degradante jugo da privação. Estes
são os pobres, e entre eles não há elegância nas maneiras nem encanto no discurso, civilização,
cultura, refinamento nos prazeres, ou alegria de viver. Da força coletiva deles, a Humanidade
ganha muito em prosperidade material. Mas o que ela ganha é apenas o produto material, e o
homem pobre não tem em si mesmo nenhuma importância. É apenas o átomo infinitesimal de
uma força que, longe de tê-lo e...